segunda-feira, 17 de novembro de 2025

O RESPONSÁVEL POR CRIAR OS NOSSOS HÁBITOS - SEJAM ELES BONS OU RUINS

 

GÂNGLIO BASAL

O SUJEITO RESPONSÁVEL POR NOSSOS HÁBITOS SEJAM ELES BONS OU RUINS

Por Heitor Jorge Lau

            Quando pensamos em hábitos, geralmente lembramos de coisas simples do dia a dia: escovar os dentes, amarrar os cadarços, tomar café pela manhã ou até mesmo roer as unhas sem perceber. São comportamentos que parecem automáticos, quase como se fossem executados por uma parte de nós que não precisa de esforço consciente. Mas por trás dessa aparente simplicidade existe um processo complexo dentro do cérebro, e uma das estruturas mais importantes nesse processo é o chamado gânglio basal. Para quem nunca ouviu falar, o nome pode soar estranho, mas entender o papel dessa região ajuda a compreender como os hábitos se formam, se mantêm e até como podem ser mudados. O gânglio basal não é uma única peça isolada, mas sim um conjunto de núcleos, ou seja, pequenos agrupamentos de neurônios que ficam localizados em áreas profundas do cérebro. Imagine o cérebro como uma cidade: na superfície estão os bairros mais visíveis, como o córtex, responsável por funções conscientes, raciocínio e tomada de decisão. Já o gânglio basal seria como um conjunto de centrais subterrâneas que controlam o fluxo de energia e coordenam movimentos e padrões de comportamento. Ele não trabalha sozinho, mas em parceria com outras regiões, recebendo informações e enviando sinais que ajudam a decidir como e quando uma ação deve ser executada.

            Uma das funções mais conhecidas do gânglio basal é o controle do movimento. Sem ele, seria difícil realizar gestos coordenados, como andar ou escrever. Mas além dessa função motora, o gânglio basal tem um papel essencial na formação de hábitos. Isso acontece porque ele é capaz de “automatizar” sequências de ações que repetimos muitas vezes. Pense em quando você aprendeu a dirigir. No início, cada passo exigia atenção: colocar a chave, girar, pisar na embreagem, mudar a marcha, olhar os espelhos. Era cansativo e exigia foco. Com o tempo, porém, essas ações se tornaram naturais. Hoje, ao dirigir, você provavelmente conversa, pensa em outras coisas ou ouve música, enquanto seus pés e mãos executam os movimentos quase sem esforço. Esse processo de transformar uma atividade consciente em automática é justamente o que o gânglio basal facilita. O cérebro funciona como uma máquina que busca eficiência. Ele prefere gastar menos energia sempre que possível. Quando uma tarefa é nova, o córtex frontal, responsável pelo planejamento e pela atenção, trabalha intensamente. Mas à medida que repetimos essa tarefa, o gânglio basal começa a assumir o comando. Ele cria uma espécie de “atalho” que permite que a ação seja realizada sem que precisemos pensar em cada detalhe. É como se o cérebro dissesse: “Já sei como isso funciona, não preciso gastar energia com isso toda vez”. Esse mecanismo é o que dá origem aos hábitos, sejam eles bons ou ruins.

            Um hábito pode ser entendido como um ciclo. Primeiro, existe um gatilho, algo que inicia o comportamento. Pode ser um horário, uma emoção ou uma situação específica. Em seguida, vem a rotina, que é a ação em si. Por fim, existe a recompensa, que é a sensação de prazer ou alívio que reforça o hábito. O gânglio basal participa desse ciclo registrando e fortalecendo as conexões entre gatilho, rotina e recompensa. Por exemplo, se toda vez que você chega em casa cansado abre a geladeira e come um doce, seu cérebro associa o cansaço (gatilho) à ação de comer (rotina) e ao prazer do açúcar (recompensa). Com o tempo, essa sequência fica gravada no gânglio basal, e você passa a repetir o comportamento quase sem pensar. Esse processo explica por que é tão difícil mudar hábitos. O gânglio basal não “esquece” facilmente. Uma vez que uma rotina foi registrada, ela pode permanecer disponível por anos, mesmo que você não a pratique com frequência. É por isso que pessoas que param de fumar podem sentir vontade de acender um cigarro depois de muito tempo sem fumar, se forem expostas a um gatilho familiar, como estar em um bar ou sentir o cheiro de tabaco. O hábito está guardado no gânglio basal, pronto para ser ativado.

            Mas se o gânglio basal grava hábitos, como conseguimos mudar comportamentos? A resposta está em compreender que não é possível simplesmente apagar uma rotina, mas sim substituí-la. O cérebro é plástico, ou seja, capaz de se reorganizar. Quando tentamos mudar um hábito, precisamos manter o mesmo gatilho e a mesma recompensa, mas trocar a rotina. Imagine alguém que tem o hábito de comer doces sempre que se sente ansioso. Se essa pessoa tentar simplesmente eliminar o comportamento, provavelmente terá dificuldade. Mas se ela substituir o doce por uma caminhada rápida ou por beber um copo de água, mantendo o gatilho (ansiedade) e a recompensa (sensação de alívio), o gânglio basal pode aprender a registrar a nova rotina. Com repetição, o novo hábito se fortalece e o antigo perde espaço. Outro aspecto interessante é que o gânglio basal não distingue entre hábitos bons e ruins. Ele apenas registra padrões de comportamento que se repetem. Isso significa que tanto escovar os dentes quanto procrastinar podem ser automatizados. O que determina se um hábito é benéfico ou prejudicial é o contexto e o impacto que ele tem na vida da pessoa. Por isso, entender o papel do gânglio basal ajuda a perceber que mudar hábitos exige consciência e esforço inicial, mas que, com o tempo, o próprio cérebro pode trabalhar a nosso favor.

            A ciência tem mostrado que o gânglio basal também está envolvido em processos de motivação e recompensa. Ele se conecta com áreas do cérebro que liberam dopamina, um neurotransmissor associado ao prazer e à motivação. Quando realizamos uma ação que gera satisfação, como comer algo saboroso ou receber elogios, a dopamina reforça a conexão entre o comportamento e a sensação positiva. Esse reforço químico é fundamental para que o hábito se consolide. É como se o cérebro dissesse: “Isso foi bom, vamos repetir”. Por outro lado, quando uma ação não gera recompensa, o hábito tende a não se formar. Esse mecanismo explica por que muitas vezes buscamos repetir comportamentos que nos dão prazer imediato, mesmo que tenham consequências negativas a longo prazo. O gânglio basal registra a recompensa imediata e fortalece o hábito, sem avaliar os efeitos futuros. É por isso que vícios, como o uso de drogas ou o consumo excessivo de alimentos, podem ser tão difíceis de controlar. O prazer imediato é registrado com força, e o hábito se torna resistente à mudança.

            Apesar disso, o gânglio basal também pode ser treinado para favorecer hábitos positivos. A repetição é a chave. Quanto mais vezes praticamos uma ação desejada, maior a chance de ela se tornar automática. É como criar trilhas em um campo: no início, o caminho é difícil, cheio de obstáculos. Mas à medida que mais pessoas passam por ali, a trilha se abre e fica mais fácil de seguir. No cérebro, cada repetição fortalece as conexões neurais, tornando o hábito mais sólido. Por isso, pequenas mudanças consistentes podem ter grande impacto ao longo do tempo. Além da formação de hábitos, o gânglio basal também participa da tomada de decisões rápidas. Muitas vezes, diante de uma situação, não temos tempo para pensar em todas as opções. O gânglio basal ajuda a escolher a ação mais provável ou mais praticada anteriormente. Isso é útil em situações cotidianas, como atravessar a rua ou responder a uma pergunta simples. O cérebro recorre ao que já está registrado como hábito para economizar tempo e energia.

            Curiosamente, o gânglio basal também está ligado à criatividade, embora de forma indireta. Ao automatizar tarefas rotineiras, ele libera espaço no córtex frontal para que possamos pensar em coisas novas. É como se, ao não precisar se preocupar com detalhes básicos, o cérebro pudesse se dedicar a ideias mais complexas. Por exemplo, quando você já domina a arte de tocar violão, não precisa pensar em cada acorde. Isso permite que sua mente explore novas melodias e criações. Nesse sentido, os hábitos não apenas simplificam a vida, mas também abrem caminho para a inovação. Do ponto de vista evolutivo, o gânglio basal foi fundamental para a sobrevivência humana. Em ambientes hostis, era importante automatizar comportamentos que aumentavam as chances de sobrevivência, como fugir de predadores ou buscar alimentos. A capacidade de transformar ações repetidas em hábitos rápidos e eficientes deu vantagem aos nossos ancestrais. Hoje, embora vivamos em contextos diferentes, essa mesma capacidade continua sendo essencial para lidar com a complexidade da vida moderna.

            É interessante notar que o gânglio basal também está envolvido em algumas doenças neurológicas. Em condições como o mal de Parkinson, por exemplo, há uma degeneração de células que afeta diretamente o funcionamento dessa região. Isso compromete tanto os movimentos quanto a capacidade de formar ou manter hábitos. Pessoas com Parkinson podem ter dificuldade em iniciar ações ou em manter rotinas simples, o que mostra o quanto o gânglio basal é central para nossa vida cotidiana. Portanto, o gânglio basal é como um maestro silencioso que organiza a orquestra dos nossos hábitos. Ele observa, registra e automatiza comportamentos, permitindo que possamos viver de forma mais eficiente. Graças a ele, não precisamos pensar em cada detalhe de nossas ações diárias. Mas essa mesma eficiência pode se tornar um desafio quando os hábitos são prejudiciais. Entender como essa estrutura funciona nos dá ferramentas para mudar padrões e construir rotinas mais saudáveis. Então...cuidado com tudo aquilo que você faz repetitivamente...isto pode ser difícil de abortar das rotinas da mente.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário