quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

SONHOS E SIMBOLOGIA


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SONHOS E SIMBOLOGIA


Por: Ms. Heitor Jorge Lau
Doutorando em Psicologia Cognitiva
Mestre em Educação
Pós-graduado em Gestão de Pessoas
Bacharel em Comunicação Social


      O texto a seguir tem por objetivo expressar o conhecimento adquirido sobre os conceitos estabelecidos por Sigmund Freud a respeito da análise e interpretação dos Sonhos. Demais opiniões oriundas da Neurociência ou contrapontos como do pesquisador James Allan Hobson (que acredita serem os sonhos um subproduto da atividade cerebral noturna) não serão confrontadas neste interim. Servirão, sim, como fontes para argumentação e crítica. Por outro lado, o termo ‘símbolo’ exigirá uma brevíssima contextualização para melhor entendimento do teor redigido.

            Seria um erro gravíssimo por parte de um Psicanalista imaginar que a força oculta do inconsciente é inócua. O inconsciente é silencioso, escondido e surpreendentemente sorrateiro, afinal revela desejos e comoções “adormecidas” por intermédio de sinais sintomáticos ou, segundo Freud, sonhos. Os sonhos, por sua vez, são compostos de simbologias com potencial de confundir até mesmo um profissional experiente da saúde mental. O Pai da Psicanálise foi sabiamente categórico ao afirmar que a linguagem dos sonhos é constituída essencialmente de símbolos, e que a sua manifestação é uma representação sensória do inconsciente, evocadas por estímulos externos (ou não). Um símbolo detém um forte vínculo com o seu objeto recalcado ou objetos de determinado contexto. Logo, seria sensato reconhecer que ao analisar um ou mais sonhos o Analista percorra uma via que conduz ao inconsciente e seus conteúdos selados. Ao “mexer” no inconsciente por associação livre ou interpretação dos sonhos, o terapeuta traz à tona estados de pura excitação. Sentimentos que podem revelar os estímulos das psiconeuroses manifestas, dissimuladas ou incubadas.

            A linguagem e a simbologia no contexto

            “Aquele médico é um açougueiro”. Esta afirmação não é verdadeiramente literal (a princípio, afinal, nada impede tal possibilidade), pois se trata tão somente de uma metáfora que intenta desabonar um profissional (pelo menos para quem proferiu a simbologia). O que permite alguém interpretar e consequentemente compreender o uso não literal da linguagem é a contextualização com saberes provenientes das esferas culturais e sociais, linguísticas e cognitivas. Os conteúdos oníricos - mais do que qualquer outro – demandam conhecimentos específicos, profundos e muita vivência para interpretação. 

            Os significados culturais são deveras importantes na simbologia de contexto. Alguns exemplos: - o ato de cruzar os dedos é usual em países ocidentais, cujo significado é atrair sorte. Todavia, no Vietnã simboliza a genitália feminina. - Na Alemanha, ao escutar com as mãos nos bolsos, o ouvinte transmite ao interlocutor total desinteresse pelo conteúdo. - Na América Latina e determinados países ocidentais, acenar com o punho fechado e o polegar para cima, significa “ok”, ou seja, denota a concordância com algo dito ou realizado, ou ainda, que está tudo bem. No Oriente Médio é considerado um insulto indecoroso. Na Grécia, Rússia e alguns países da África é considerado um insulto. Estes foram mínimos gestos simbólicos que podem causar alvoroço e controvérsias conforme a cultura e costumes sociais.

            Sonhos – uma porta para a simbologia do desconhecido

            O Psicanalista, ao ouvir o Conteúdo Manifesto do paciente, precisa estar atento as nuances do relato e não pode ignorar ou negligenciar qualquer detalhe. A integridade e composição da análise do sonho dependerá essencialmente das particularidades percebidas no decorrer da sessão. No instante de escutar, a capacidade de perceber os fragmentos do todo fará a diferença na etapa da análise. As Associações Livres que o Analista porventura executar devem ocorrer sobre as frações “recortadas” do todo, afinal, o sonho detém a irracionalidade e incoerência. Os mecanismos conhecidos de formação do conteúdo do Sonho Latente disfarçam o sonho manifesto. Se por um lado inexistem pensamentos abstratos no sonho, por outro, as imagens são concretas mesmo sendo ilógicas e impossibilitadas de tradução (paradoxal isso!). O mesmo ocorre na Condensação, Desdobramento, Deslocamento, Representação do Oposto, ..., dissimulam as pulsões ora recalcadas no ID. 

            A simbologia por si só é passível de análise e interpretação. Mas é importante pensar como um conjunto de símbolos se forma na mente do ser humano. Será que os Modelos Mentais sui generis, o capital cultural e intelectual pessoal ou um possível déficit cognitivo pode influenciar (ou distorcer ainda mais) o desenvolvimento da simbologia contida nos sonhos? Como se revela o sonho de um paciente com concepções errôneas ou distorcidas sobre aquilo que é considerado convencional, normal, anormal, excêntrico, imoral, ...? Como seria o sonho de um indivíduo que ingere Antipsicótico? Teria o Aparelho Psíquico a capacidade de ajustar recalques constituídos a partir de experiências incomuns ou surpreendentes para uma simbologia compreensível? Esses são alguns questionamentos leigos instigados por um princípio Aristotélico: "A dúvida é o princípio da sabedoria".

            Análise e interpretação – o desafio que não pode conter erro

            Criticar símbolos exige um conhecimento muito aprimorado sobre a capacidade do cérebro de perceber imagens com sentido denotativo ou conotativo - quase sempre inconscientemente. A saber, o sentido denotativo percebe um símbolo (imagem) pela revelação da expressão literal que ele representa, ao invés da insinuação por ele provocada. Por outro lado, a conotação remete ao sentido mais amplo que se pode atribuir para uma simbologia, que vai muito além da sua própria significação ou intenção. Em síntese trata-se do sentido atribuído ao símbolo por consequência das associações motivadas pelo significado popular que oscila de acordo com as experiências e sensibilidade do Analista – sem esquecer a influência do contexto. Ainda, no âmbito da estilística, o sentido conotativo é empregado com sentido metafórico ou figurado em total contrariedade ao sentido comum, próprio e denotativo.

            No decorrer do dia-a-dia o ser humano exercita inconscientemente análises denotativas e conotativas pelo simples fato de serem decorrentes do automatismo inerente as funções psicosensoriais. Portanto, cabe ao Psicanalista decidir em que momento ele deverá utilizar o sentido denotativo, o qual requer grande capacidade analítica, centrada rigorosamente no objeto (símbolo), e que exige um total resfriamento da concepção emocional, a fim de evitar que o racional seja sobrepujado pelo sentimental. Ou, em que momento usar o sentido conotativo, totalmente liberto das amarras do racional e da lógica.

            Enfim, ponderando tais considerações, seria sensato cogitar que uma efetiva análise e interpretação de sonhos teria mais chance de sucesso na medida que a sua simbologia fosse relativizada por duas aptidões: a aptidão intelectual-interpretativa e aptidão emocional-sensitiva. A primeira, quanto mais apurada, maior a possibilidade de sucesso de uma análise denotativa dos sonhos (razão pura); a segunda, quanto mais apurada, maior a possibilidade de sucesso de uma análise conotativa dos sonhos (emoção pura). Em síntese, o equilíbrio e dosagem no decorrer do processo, caso a caso, seria o ideal. Colocar descrédito na técnica da interpretação dos sonhos não seria o mais importante neste interim. Antes disso, mais significativo, cabe ao Psicoterapeuta a reflexão e decisão racional e responsável a respeito de adotar ou não a técnica da interpretação dos sonhos no seu escopo de atuação – ao menos nos primeiros anos do exercício da profissão – porque a mente do paciente não suportaria equívoco no diagnóstico e muito menos no prognóstico do seu problema. De todas as convicções de Sigmund Freud, James Allan Hobson (Neurocientista), Mark Solms (Pesquisador na área da Neuropsicanálise), e tantos outros, a maior certeza de todas é que ainda não se conhece tudo – ou pouco - sobre os sonhos.

“A dúvida é o princípio da sabedoria”.
Aristóteles

PSICOPATOLOGIAS II


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PSICOPATOLOGIAS II
                      
Por: Ms. Heitor Jorge Lau
Doutorando em Psicologia Cognitiva
Mestre em Educação
Pós-graduado em Gestão de Pessoas
Bacharel em Comunicação Social

            Existe uma gama considerável de distúrbios do aparelho psíquico possíveis de serem considerados interlaçados - talvez um distúrbio conduza a outro ou um dependa de outro.  Com o intuito de redigir um texto que sintetize um pensamento crítico a partir do exposto, ao invés de meramente replicar os conhecimentos, foram destacados dois termos para o desenvolvimento de uma redação focada: transtorno e reação.

            Os parágrafos a seguir não visam defender algum ponto de vista ou conferir mérito maior ou menor a um ou outro pesquisador, seja ele profissional da área da saúde ou não. Nem tão pouco descreditar o mérito de estudos empíricos ou teóricos do passado e da atualidade. Por outro lado, ambiciona provocar o debate e a crítica. A ideia essencial seria exercitar um olhar enfático sobre as potencialidades da mente humana, capaz de imaginar e criar Psiconeuroses a partir de fatores causais que precipitem ou predispõem uma doença. A quem credite as reações humanas, única e exclusivamente, a processos que envolvem o corpo físico. William James, Psicólogo e Filósofo norte-americano, pai da Escola Filosófica conhecida como Pragmatismo, e um dos pioneiros da Psicologia Funcional, por exemplo, foi um deles. Esta visão reducionista dá “pouca ou nenhuma importância ao processo de avaliação mental da situação que provoca a emoção”. (DAMÁSIO, 2012, p; 128)[1]

            Contextualização de um ícone da medicina mental

            A fim de enriquecer a exposição que segue, um ilustre nome será introduzido na argumentação, Alfred Adler (1870-1937). Diplomado em medicina em 1895 pela Universidade de Viena, após especialização em Oftalmologia tornou-se um Psiquiatra. Membro fundador (em seguida presidente) da Sociedade Psicanalítica de Viena, iniciou uma fase de críticas e discordâncias frente as ideias de Freud (e de outros membros da instituição por ele presidida) no decorrer de sua trajetória, coeficientes que suscitaram a sua renúncia ao cargo ocupado.

            Apesar de um histórico de infância problemática, as adversidades serviriam de incentivo para a busca da titularidade de médico e posterior criação da Teoria da Personalidade. O aspecto importante da hipótese foi de encontro ao ponto culminante de Freud que preconizava os instintos inatos do ser humano como o princípio da motivação comportamental. Adler foi incisivo ao mencionar que todo indivíduo é influenciado e estimulado por impulsões sociais. Se por um lado Freud sublinhou o sexo, Adler focalizou os aspectos determinantes do interesse social no comportamento humano.

            O embate entre o Ego, de Freud, e o Self Criativo, de Adler, culminaram na redução do instinto sexual como determinante exclusivo da formatação do comportamento, ou seja, o ser humano seria um ser social antes de um ser sexual. Portanto, uma vez que o indivíduo é influenciado por impulsos sociais, ele se transforma numa criatura propensa a absorver todo e qualquer estímulo que o conduza para algum tipo de transtorno, basta estar com a mente fragilizada o suficiente para permitir tal feito.

            Cérebro – uma máquina de associações

            Era uma vez um garoto de apenas 10 anos de idade que anualmente desfrutava das férias de verão junto dos pais em uma bela praia gaúcha. Em certo janeiro os pais tiveram uma ideia “brilhante” de entretenimento: assistir O Tubarão, um inesquecível filme. O resultado foi traumático para a criança cuja mente encontrava-se fulminantemente imaginativa. A tenra faixa etária associada ao oceano contendo um tubarão à espreita foram os ingredientes necessários para que a criança não encontrasse “um pingo” de coragem para entrar nas águas do mar pelo resto da temporada. Motivo: a iminência de ser estraçalhado e devorado por um tubarão enorme com dentes gigantescos e afiados, surgido silenciosamente das profundezas do Oceano Atlântico. 

            Transtorno de Ansiedade – Fobia – Personalidade

            O mesmo (ou, provavelmente mais intenso) fluxo de adrenalina produzido durante o filme era reprisado no momento do deslocamento até a beira da praia – quanto mais perto da água, mais acentuada as Reações da Fobia. Surge então, neste contexto, a Fobia por Associação. Dentre as várias Psicopatologias existentes, a Fobia foi escolhida para dar prosseguimento ao raciocínio. Por mais numerosas que fossem as tentativas de fazer a criança entender que a história assistida era ficção e que jamais tal fato aconteceria, a Fobia permaneceu e prevaleceu.

            As funções do Córtex Frontal - responsável pelo julgamento, controle de impulsos, e pensamento crítico (dentre as demais funções) - foram inteiramente subjugadas pelas funções da Amigdala - ativada em situações com marcante significado emocional. Esse episódio traumático real poderia ser facilmente substituído por um outro qualquer associado ao Transtorno de Humor, Hipocondria, Disfunção Sexual ou Ansiedade Generalizada... basta pensar nas histórias de vida por algum momento. Questões: – Como seria a mente da criança se os pais a obrigassem a entrar na água? Ou, se o medo virasse motivo de piada? Seria sensato afirmar que o pavor de uma temporada poderia perdurar por uma vida por intermédio de um Transtorno causador do Medo, ou Pânico, ou Fobia... e suas respectivas Reações.

            As defesas da mente contra o enfrentamento dos problemas

            É interessante ressaltar que tanto Adler quanto Freud concordavam que os mecanismos psíquicos geram artifícios defensivos para as Neuroses. Um indivíduo com Distúrbio Neurótico detém a incapacidade de administrar os problemas do cotidiano a partir do desenvolvimento de “salvaguardas” (um conceito importante de Adler, congênere aos mecanismos Freudianos de defesa). Três salvaguardas foram categorizadas (na época): Desculpas; Agressão; Distanciamento. A primeira constitui, ardilosamente, desculpas para os fracassos da vida (a culpa jamais recai sobre o próprio indivíduo); A segunda, Agressão, busca culpados por tais fracassos; a terceira, o Distanciamento, infligi postergações, justifica os fracassos pela debilidade de impedir os problemas originários dos fracassos da vida (vitimização).

            Considerações finais

            Um comportamento considerado anormal - biológico ou sociológico (baseado em patologias conhecidas do cérebro: orgânicas ou biogênicas), psicogênico (quando não é patologia cerebral conhecida:), ou sociogênico (fatores sociológicos) pode ser identificado, remediado, evitado ou controlado. Resta refletir sobre os tipos e quantidade de reações emocionais que já se encontram inatas no ser humano desde o seu nascimento e quais são instigadas por indução ou pela ausência de orientação. É perfeitamente aceitável que algumas reações emocionais pré-programadas internamente, como o medo, possam ser acionadas frente a estímulos externos.

            Por exemplo: não tenho medo de entrar no mar, desde que inexista tubarões. Neste exemplo o medo encontra-se (de certa forma) predisposto, todavia, necessita de um estímulo precipitante. As Reações do corpo humano físico e mental independem da identificação do objeto estimulante, ou seja, uma pessoa não demanda perceber um tubarão por perto, basta enxergar uma barbatana (seja ela de um golfinho) para permanecer longe do mar.

            Portanto, se o corpo é dotado de Córtices Sensoriais para detectar, classificar e enviar os sinais para as Amigdalas, como evitar ou driblar as Neuroses que “rodeiam” o dia-a-dia de cada indivíduo. Os Transtornos Cognitivos, as Perturbações Neuróticas, enfim, as Reações Psicossomáticas podem ser desencadeadas (ou não) por um simples ato de assistir um filme errado, no local e tempo inapropriado. Haja Freud, Jung, Adler e toda a sociedade psicanalítica para tantos vieses de possíveis perturbações do Aparelho Psíquico.
“Só não existe o que não pode ser imaginado”.
Murilo Mendes


[1] DAMÁSIO, R. A. O Erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. 3ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.