ANTROPOLOGIA E PSICANÁLISE
Por: Ms. Heitor Jorge Lau
Doutorando em Psicologia Cognitiva
Mestre em Educação
Pós-graduado em Gestão de Pessoas
Bacharel em Comunicação Social
O tema
eleito para essa exposição do conhecimento adquirido, Antropologia e
Psicanálise, surgiu ao final dos estudos sobre Libido e Sexualidade. Cabe
ressaltar que a redação que segue comporta uma composição díspar dos artigos
anteriores. A característica básica são os recortes de artigos e uma pequena
parte de um texto estudado, inseridos no contexto no formato autêntico, uma vez
que o autor desse trabalho considerou importante manter a arquitetura original
por se tratar de um arquétipo acadêmico.
Para
introduzir o conteúdo uma transcrição direta importante:
“O
psicanalista deve compreender perfeitamente a natureza e a função da cultura considerada em si mesma [...]”.
(Essais d’ethnopsychiatrie générale, p. 337-228).[1]
Existe uma
forma (entre outras) de estudar a fundo a natureza do ser humano: através da Antropologia. O termo em questão surge
a partir da congregação de duas palavras de origem grega, Anthropos, cujo significado é ser humano, e Logos, que significa razão ou conhecimento. Assim sendo, a
associação delas já explica ou remete ao seu significado de estudo do Homem na
vida sociável (Politika). Trata-se de
uma ciência que estuda e busca entender as coletividades, o ser humano e seu
comportamento em sociedade (não confundir com Sociologia que detém outro objeto
de estudo). Uma vez dito que a Antropologia investiga o comportamental em
sociedade, surge outro termo: a Antropologia
Social, ciência que explora as relações e organizações políticas e sociais
mais aprofundadamente naquilo que concerne as relações homem-sociedade. Existem
vertentes científicas que percebem quatro âmbitos distintos na Antropologia: -
Antropologia Física (ou Biológica); - Antropologia Arqueológica; - Antropologia
Linguística; e, - Antropologia Cultural. Nessa exposição a última ficará em
evidência, uma vez que o intuito é promover um recorte e correlatar cultura com
a psicanálise. Compete a Antropologia
Cultural, de vertente norte-americana, pesquisar traços culturais que
envolvem características linguísticas e religiosas, mitos e ritos, crenças e
valores, dentre outros significantes não menos relevantes. A fim de
contextualizar essa composição faz-se necessário enfatizar que uma das grandes
áreas de estudo da Antropologia Cultural é a Etnografia. Esse campo científico vem ao encontro da Psicanálise porque
é reconhecido como Método da Observação
Participante (apenas observar o indivíduo no seu habitat). Como
consequência da observação direta do grupo focal por parte do Antropólogo ou Etnógrafo
(designação esta do observador que faz uso da Etnografia), emergem dados e
informações importantes que serão confrontadas com teorias comportamentais (ou
surgirão novas teorias).
O Pai da
Psicanálise, Freud, salientou que um símbolo “tira sua significação do
contexto, da sua relação com outros símbolos, que por sua vez só adquirem
sentido relativamente a ele. Esta segunda via pode ser fecunda, desde que a
técnica simplista das associações livres ocupe o lugar que lhe compete num
esforço global que visa reconstituir a história pessoal de cada sujeito, a do
seu meio familiar e social, a sua cultura....
Procuraria assim compreender-se um indivíduo do modo como o etnógrafo procura compreender uma
sociedade”.[2]
O
parágrafo anterior sugere ou incita uma reflexão sobre quem é o criador e quem
viria a ser a criatura, ou seja, a família que molda a sociedade que por sua
vez modela a cultura, ou a ordem inversa? Por ora, adotar a ordem inversa
talvez seja a escolha mais apropriada para a exposição que o presente texto se
propõe. Assim, se a cultura desenha e compele a sociedade a se comportar dentro
de um modelo delineado por costumes históricos, nada mais sensato do que recordar
que Sigmund Freud influenciou, por intermédio das suas pesquisas, muitos
profissionais da Psicanálise a estudar a gênese dos símbolos culturais (que
abarcam toda espécie de praxe). Ícones da história como Roheim e Fromm (dentre
outros), como exemplo, foram considerados Antropólogos Psicanalistas. Seria
inadmissível obliterar dos renomados anteriormente citados o nome de Georges
Devereux, reconhecido como sendo o precursor da Etnopsicanálise (personagem que inspirou a escolha deste tema –
dentre tantos outros que acenam relevância). A Etnopsicanálise conjuga
Antropologia e Psicanálise - Antropologia Psicanalítica. Este formato - um
diálogo multidisciplinar entre as teorias e práticas das Ciências Sociais e de
Freud – permitiu ineditamente a compreensão das manifestações do ser humano por
intermédio da Psicanálise e Etnologia, simultaneamente.
Diante dos
estudos sobre a influência exercida pelo meio social e cultural sobre o
Aparelho Psíquico, seria sensato e prudente reconhecer que a Transferência ou
os Mecanismos de Defesa do Ego, como o Recalcamento, a Renegação e Sublimação,
por exemplo, funcionem de forma diferente em culturas diferentes. Portanto, “(...)
psiquiatras e psicanalistas deveriam se interessar pelo meio cultural
específico do paciente e se esforçar para compreender suas produções em função
do meio dele (paciente) e não do seu (psiquiatra)”.[3]
Aparentemente
esta recomendação é um tanto dificultosa de ser exercida na prática, afinal,
aculturamento não se efetiva da “noite para o dia”. Seria preciso uma imersão
significativa nos diversos contextos culturais existentes nas sociedades
acessíveis à terapia. Mesmo dentro de uma região especifica e bem delimitada,
ainda assim, existem “subculturas”, ou melhor dizendo, culturas dentro de
culturas. Em determinadas regiões, os traços culturais de um bairro para outro
podem mudar drasticamente pelo simples fato de uma população de origem distinta
predominarem em uma região e não em outra. No Brasil a diversidade cultural
parece ser mais ampla por fatores históricos. O súbito aparecimento de um
indivíduo de cultura muito distinta do Terapeuta pode provocar um equívoco na
interpretação dos discursos no decorrer da análise. A cautela no decorrer do Tratamento
de Ensaio deve ser intensa porque neste momento o Psicanalista, ao perceber
muitas divergências culturais contundentes, precisa abdicar do paciente. O
ideal, conforme Psicanalistas experientes, seria a relação paciente-analista
acontecer em pé de igualdade cultural.
Apesar do
objetivo da Psicanálise ser o de buscar as origens das neuroses nas profundezas
do Inconsciente, as relações sociais, tanto como fontes históricas dos
tormentos passados, quanto fontes atuais das manifestações presentes, deveriam
ser consideradas epistemologicamente. Portanto, ao terapeuta cabe a difícil e
complexa tarefa de perceber o quanto um indivíduo foi ou é influenciado pela
cultura em que se encontra inserido. Afinal, neurótico ou psicótico, seja qual
for o tormento (ou considerado socialmente normal), todos são influenciados ou
condicionados de alguma forma pela cultura que os cercam.
“A única ponte que ainda une o homem moderno ao
homem “arcaico” é o psiquismo humano; só
as exterioridades mudam; o substrato fantasmático – o Inconsciente – é
intemporal”. (Baubo, la vulve mythique, p12).[4]
[1] Fonte:
GEORGES DEVEREUX, O PROJETO ETNOPSIQUIÁTICO E ALGUMAS ILAÇÕES
EDUCATIVO-ORGANIZACIONAIS. Por: José Carlos de Paula Carvalho. R. Fac. Educ.,
14(1):23-24, 1988. p.1.
[2]
Modulo 4. Libido e Sexualidade. p. 77.
[3]
Etnopsicanálise: embasamento crítico sobre teoria e prática terapêutica. Por:
BARROS, M. L.; BAIRRÃO, J. F. M. H. Revista da
SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo Jan.-Jun.
2010, Vol. 11, No. 1, pp. 45-54. (DEVEREUX,
1977, p. 344, tradução dos autores).
[4]
Fonte: GEORGES DEVEREUX, O PROJETO ETNOPSIQUIÁTICO E ALGUMAS ILAÇÕES
EDUCATIVO-ORGANIZACIONAIS. Por: José Carlos de Paula Carvalho. R. Fac. Educ.,
14(1):23-24, 1988. p.1.
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