quinta-feira, 19 de junho de 2014

ENSINO INCLUSIVO

Por Heitor Jorge Lau
Empresário e Educador
Mestre em Educação
Pós-Graduado em Gestão de Recursos Humanos
Bacharel em Comunicação Social – Relações Públicas
Analista de Sistemas da Informação


Capítulo 2 replicado da Dissertação de Mestrado


ENSINO INCLUSIVO

            Pela ótica dos direitos humanos todo o cidadão com alguma deficiência tem o direito de estar presente na escola, sendo as instituições escolares as responsáveis diretas pela adaptação das condições físicas e didáticas ao processo de ensino aprendizagem. Em 1994, por intermédio da Conferência Mundial da UNESCO sobre Necessidades Educacionais Especiais, está mensagem foi nítida e claramente difundida. Segundo Sanchez (2005), sob uma visão mais abrangente seria possível afirmar que o ensino inclusivo é uma prática de inclusão direcionada a todos, independentemente da deficiência em questão, das habilidades particulares, da historicidade cultural ou socioeconômica do aluno. A questão essencial e básica seria prover as salas de aula com recursos físicos, intelectuais e didáticos suficientes para suprir as necessidades dos alunos especiais e demais, simultaneamente. Guebert (2007) aborda amplamente que o processo de ensino aprendizagem, quando articulado com esmero, quando visualizado sem segregação, possibilita aos alunos especiais a oportunidade de desenvolverem-se como cidadãos do mundo, proporciona possibilidades para a convivência em sociedade. Os professores, protagonistas desta socialização educacional também acabam por incrementar as suas habilidades enquanto docentes inclusivos. O reflexo deste mosaico de intenções e exercícios poderá provocar na sociedade uma reflexão consciente quanto ao acolhimento dos alunos especiais de forma mais natural, com igualdade social e consequente melhora da paz mundial. O ensino inclusivo é composto por três aspectos práticos de mútua dependência. O primeiro seria a rede de apoio, talvez o mais importante deles por envolver no componente organizacional a coordenação de equipes e pessoas em estado de cooperação por intermédio das relações formais ou informais. O segundo, também de grande valor, diz respeito aos procedimentos, no qual as equipes e as pessoas de especialidades variadas desenvolvem e implementam processos, projetos e programas direcionados a diversidade de alunos para conviverem em ambientes totalmente integrados. O terceiro e último aspecto está relacionado à aprendizagem cooperativa, o qual inspira cuidados para a geração de um ambiente de ensino em que o alunado, mesmo com suas particularidades, interesses variados e desiguais, e habilidades dessemelhantes alcance o seu máximo potencial individual. Os benefícios oriundos dos ambientes de aprendizagem inclusiva são variados, não somente para os alunos especiais, mas aos docentes e comunidades.

        Os ambientes integrados de aprendizagem inclusiva são enriquecedores uma vez que os todos os alunos são oportunizados em aprender uns com os outros, em desenvolverem o senso de cuidar uns dos outros. Silva (2010) reflete que é relevante enfatizar que a mera inserção de um aluno especial dentre os demais alunos em sala de aula não reverte a ação, propriamente dita, em situação favorável de aprendizagem. Seria uma ótica muito simplória. Os estudiosos lidos observam que os alunos especiais com níveis diferenciados de deficiência acabam por aprender com mais intensidade e profundidade quando se encontram em ambientes não segregados, integrados. Nesses ambientes o apoio e, principalmente, as experiências propiciadas precisam ser enfaticamente adequadas. A adequação da didática e um ambiente favorável convertem os esforços educacionais em resultados positivos para todos os alunos, com e sem deficiência. Perrenoud (1997) alertava que “uma parte dos alunos reprova, não por falta de meios intelectuais, mas porque não conseguem encontrar o seu lugar na aula e entrar em contacto com os professores”. Talvez o maior ganho dessa provável e possível integração, inclusão, esteja presente na preparação do aluno especial para a vida em sociedade. A questão chave no processo de educação inclusiva encontra-se na interação e no delineamento das relações amigáveis e cooperativas entre os colegas. O desenvolvimento de laços afetivos transcende a objetividade de qualquer conteúdo redigido na lousa. Neste processo está envolvida a sensibilidade, compreensão, o respeito para com o diferente e até mesmo as particularidades entre colegas. Rahme (2010) afirma que alunos e alunas aprendem habilidades para a vida por intermédio da convivência, da comunicação entre os seus pares. É preciso perceber que naturalmente um aluno com deficiência não conseguirá apropriar um currículo da educação regular na sua plenitude, contudo, ele pode beneficiar-se de todas as experiências extracurriculares exercitadas no ambiente regular educacional. Incluir uma criança portadora de alguma deficiência na escola, sem qualquer ótica segregadora, possibilita ou a prepara para a vida em comunidade.


            Karagiannis, Stainback e Stainback (1999) afirmam o seguinte:

Em geral, os locais segregados são prejudiciais porque alienam os alunos. Os alunos com deficiência recebem, afinal, pouca educação útil para a vida real, e os alunos sem deficiência experimentam fundamentalmente uma educação que valoriza pouca a diversidade, a cooperação e o respeito por aqueles que são diferentes. Em contraste, o ensino inclusivo proporciona às pessoas com deficiência a oportunidade de adquirir habilidades para o trabalho e para a vida em comunidade.

            O desempenho primoroso de um aluno com deficiência está diretamente relacionado ao tempo em que ele encontra-se no ambiente inclusivo, ou seja, maior o número de horas, melhor os resultados no âmbito educacional, social e consequentemente ocupacional. Um confronto dos resultados positivos da inclusão com os efeitos negativos da segregação demonstram que existem somente benefícios envolvidos na inclusão. Ambientes inclusivos também promovem o aprendizado por parte dos docentes, uma vez que eles aprendem a interagir com pessoas que necessitam de atenção especial. A segregação é sinônimo de alienação. A questão preponderante na educação inclusiva não está na discussão sobre a obrigatoriedade ou necessidade de um aluno especial receber de profissional especializado, as experiências educativas através de alguma ferramenta ou técnica. Mas sim, disponibilizar as esses alunos, tudo o que eles precisam em ambientes integrados. Concomitantemente, atualização constante ao corpo docente, gabaritando-o como professor inclusivo. Desta forma, o valor máximo do ensino inclusivo torna-se saliente: o valor social da igualdade. Este enfoque social exemplar determina ou deixa nítido aos portadores de deficiência que, mesmo diante de alguma diferença, todos possuem direitos iguais.


            Segundo Karagiannis et al. (1999):

O ensino inclusivo faz sentido e é um direito básico – não é algo que alguém tenha de conquistar. ... Quando as escolas incluem todos os alunos, a igualdade é respeitada e promovida como um valor na sociedade, com resultados visíveis da paz social e da cooperação. ... Quando as escolas são excludentes, o preconceito fica inserido na consciência de muitos alunos quando eles se tornam adultos, o que resulta em maior conflito social e em uma competição desumana.


            As instituições de ensino precisam, incondicionalmente, promover a aceitação social, cooperação e paz maximizada. A segregação deve ser visualizada como uma prática do passado, um exercício configurado a partir da falta de experiência ou conhecimento limitado sobre a educação inclusiva e suas benesses. Segregar os alunos com deficiência ou pensar que as escolas e classes especiais seriam mais apropriadas, não passa de mera especulação ou intolerância. O aluno especial de hoje é o cidadão do futuro de amanhã. Trata-se de um desafio às escolas e comunidade escolar, todavia, o propósito é ajustar todos os alunos ao futuro em sociedade. O único resultado das práticas segregacionistas de um passado não muito distante foi o alijamento dos portadores de deficiência da sociedade. A concepção errônea de que alunos especiais poderiam ser mais bem assistidos em ambientes segregados robusteceu a rejeição e os estigmas sociais em torno da questão. Talvez, a visão das escolas regulares estivesse ‘cerzida’ pelo mito de que uma classe configurada apenas por alunos ‘normais’ não necessitasse de qualquer tipo de adaptação ou modificação. A homogeneidade do ambiente escolar e do processo de ensino aprendizagem só permite encapsular alunos especiais e demais em invólucro distinto. A rejeição e fuga da segregação convergem para a unificação do ensino regular e especial em um sistema único de ensino.


            Conforme O’Brien e O’Brien (1999):

Incluir alunos com deficiências importantes nas turmas de educação regular eleva a consciência de cada aspecto inter-relacionado da escola com a comunidade: seus limites, os benefícios a seus membros, seus relacionamentos internos, seus relacionamentos com o ambiente externo e sua história. A arte de facilitar a adesão à inclusão envolve o trabalho criativo com um estado elevado de consciência, redirecionando a energia estreitamente relacionada ao medo para a resolução de problemas que promova a reconsideração de limites, dos relacionamentos, das estruturas e dos benefícios.


            O fato é que na medida em que o ensino inclusivo fracassa ou encontra-se descaracterizado como um modelo eficiente, o alunado especial fica na dependência da boa vontade, versatilidade e criatividade do professorado. É notório ou dedutível que a educação inclusiva exige um trabalho cooperativo entre docentes, mais acentuado do que a educação regular. Quando todos objetivam o bem social através da aprendizagem inclusiva todos saem ganhando. O fluxo da aprendizagem interpessoal arquiteta uma conjuntura social sadia, na qual os ambientes e talentos são organizados de acordo com as necessidades especiais e grupais. Diante de um trabalho cooperativo, focado no social, novas ferramentas insurgem, paradigmas são extintos, e novos sistemas são moldados. É relevante expressar, mesmo que de forma redundante, que os princípios da inclusão exercem influencia sobre todos os alunos, portadores e não portadores de alguma deficiência.


            De acordo com Schaffner e Buswell (1999):

Os princípios da inclusão aplicam-se não somente aos alunos com deficiência ou sob risco, mas a todos os alunos. As questões desafiadoras enfrentadas pelos alunos e pelos educadores nas escolas de hoje não permitem que ninguém se isole e se concentre em uma única necessidade ou em um grupo-alvo de alunos. Além disso, uma abordagem fragmentada de reforma da escola não satisfaz inteiramente as necessidades dos alunos. ... As boas escolas são boas escolas para todos os alunos e, então, agir com base nesse principio.


            Outra questão deveras importante na abordagem do ensino inclusivo relaciona-se a capacidade de um docente ir muito além do papel tradicional de professor instituído por sua titulação base ou eventual especialização posterior. Não basta existir em sala de aula um professor e alunos, é necessária a sistematização do ensino inclusivo e interações sociais meticulosamente planejadas, implantadas e observadas. O planejamento sistemático prevê uma comunicação eficiente entre alunos e docentes e o sucesso de todo o processo depende desse roteiro comunicacional. Tanto o alunado quanto o professorado precisam interagir socialmente. Perrenoud (1997) afirmava que “a prática pedagógica na sala de aula não é a concretização de uma teoria, nem mesmo de regras de acção ou de receitas”. O cuidado latente da comunicação inclusiva reside na percepção de que os processos comumente utilizados – linguagem oral e escrita – pode não alcançar o efeito esperado, justamente, porque a presença de uma deficiência – auditiva ou visual – limita a extensão comunicativa do aluno deficiente. Portanto, um docente inclusivo precisa estar munido de aguçada percepção, farta criatividade e interminável perseverança. Isso é que traduz o dito anteriormente: ... um docente ir muito além do papel tradicional ... . A plenitude da escolaridade inclusiva somente será atingida diante da flexibilidade docente e de didáticas adaptadas. Smith e Ryndak (1999) citam que é incumbência do professor inclusivo identificar a necessidade de alçar mão de sistemas de comunicação aumentativos ou alternativos - CAA.

        Os CAAs possibilitam a sua utilização como mecanismos de auxilio da comunicação primária ou suplementar para alunos portadores de deficiência do aparelho fonético. Ainda, os CAAs que utilizam a simbologia como forma de comunicação são categorizados como Apoiados e Não- Apoiados. No sistema CAA Não-Apoiado, o aluno com deficiência da fala utiliza apenas o próprio corpo para a comunicação, como por exemplo, gesticulação, sinalização manual, vocalização e expressão facial. Interessante salientar que as pessoas não portadoras de alguma deficiência utilizam símbolos Não-Apoiados para expressar opinião com alta frequência, por exemplo: aceno de mão, movimento pendular da cabeça quando desejam negar ou afirmar algo, um estalo de dedos para chamar a atenção de outrem, dentre outros do dia-a-dia. Os alunos com algum tipo de limitação por deficiência usam largamente os símbolos Não-Apoiados, e o maior exemplo disso pode ser visualizado na linguagem de sinais, no caso brasileiro, principalmente Libras. Os sistemas simbólicos de CAAs Apoiados exigem, em contrapartida, instrumentos ou equipamentos acessórios ao corpo humano para emitirem uma mensagem. Contudo, nenhum dispositivo de CAA age por conta própria ou evidencia a sua importância de utilização sem a interferência humana. Smith e Ryndak (1999) também afirmam que é preciso incentivar e desenvolver alunos-aprendizes para o estabelecimento do ensino inclusivo. Isto é, acima de tudo, essencial. A gênese do aprendizado efetivo encontra-se na sensação de pertencimento de cada aluno com relação ao grupo. Como afirmam Stainback e Stainback (1999), “... entre os principais objetivos educacionais que permitem aos alunos serem membros ativos das suas comunidades estão a sociabilização e as amizades”. Cada aluno, seja ele especial ou não, precisa sentir-se valorizado, reconhecido por suas particularidades, identificado como ser individual e ao mesmo tempo social, sem qualquer espécie de segregação, predileção e muito menos sob o olhar da compaixão. Este desafio, aparentemente dantesco, enfileira o corpo docente das instituições de ensino na ala principal dos mediadores, facilitadores das comunidades de aprendizes das escolas inclusivas.



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