quarta-feira, 20 de maio de 2020

ÉTICA NA PSICANÁLISE

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Por: Ms. Heitor Jorge Lau
Formando em Psicanálise
Mestre em Educação
Pós-graduado em Gestão de Pessoas
Bacharel em Comunicação Social

             Escrever sobre Ética na Psicanálise exige, antes de qualquer coisa, uma transitada pelos significados dos termos ‘ética’ e ‘moral’. Este texto não irá analisar e “pôr em xeque” o Código de Ética Profissional do Psicanalista ou redizer o dito em outras palavras. O termo ‘ética’, tão ouvido e pronunciado dentre diversos grupos sociais, na maioria das vezes é percebido de maneira errônea, talvez por ser difícil de explicar, talvez por ser difícil de compreender. Na tradução essencialmente literal (sem considerar qualquer vertente de estudo) a ética alberga em si o constante estudo e a consequente ruminação dos costumes e comportamentos do ser humano em sociedade. Todavia, a saber, o olhar sobre a ética pode ser concebido por intermédio de um prisma estritamente científico, ou seja, percebido como ciência normativa ou ciência descritiva. Enfim, difícil de explicar, difícil de compreender.

            Moral: comportamentos em ação

            Qual o significado do termo moral? Conceitualmente, moral é a conjunção de normas, princípios e valores que regulam o comportamento dos indivíduos no convívio social. A moral é percebida em dois planos: o normativo sugere o comportamento ideal; o fatual refere-se à ação propriamente dita. Isto não significa que tudo que for moralmente apontado será efetivamente praticado ou realizado da forma proposta. Apesar dos planos poderem ser distintamente percebidos, não podem ser desassociados. Enquanto o plano normativo aponta para o ideal (moral), o fatual revela as relações humanas concretas. A partir delas surge o termo moralidade que é a moral em ação, a moral prática e praticada. Somente atos individuais com consequências sociais (para outros sujeitos) podem ser qualificados moralmente – aqui entra a questão da relação paciente x Analista.

            A moral se manifesta sempre em sociedade, nunca isoladamente. É por isso que a moral possui função social, ou seja, sustenta e assegura a ordem na sociedade. A moral não deve ser confundida com as leis instituídas pelas vias do direito. O direito possui o caráter coercitivo cujo cumprimento das regras independe da aceitação voluntária ou não do indivíduo. Ao contrário do cunho impositivo do direito, a moral sugere uma relação consciente entre indivíduos através da adoção de práticas por livre e espontânea vontade. Isto ocorre primordialmente através da ampliação da consciência particular de cada sujeito. Paralelamente a este fenômeno, a moral alcança avanços proporcionais.

            É justamente na consciência individual que as decisões de caráter moral são assimiladas, ponderadas e então, praticadas. As atitudes ou atos morais estão sempre sujeitos a julgamentos. Portanto, poderão ou não ser aprovadas. Por sua vez, o ato moral é basicamente sustentado pelo motivo que o estimula. O motivo precisa ser consciente caso contrário não é parte integrante do ato moral. O motivo caracteriza-se pela reação não instintiva. Por isso todo ato moral demanda motivo, propósito, meios de alcançá-lo, resultados e consequências. Consequências sociais traduzidas em mudanças que consequentemente provocam mudanças de conduta moral.

            Ética: a interminável disputa entre o bem e o mal

            Concomitantemente ao estudo dos costumes e comportamentos do homem na sociedade, surgirão, invariavelmente e certamente, questões relacionadas a liberdade e ao tolhimento de expressão. Todo cidadão sonha e busca (ou é incentivado a buscar) a liberdade de expressão verbal e não-verbal no microcosmo que considera o seu habitat. Porém, em contrapartida ele é tolhido de tal liberdade, coagido a observar e seguir normas impingidas e aceitas pela maioria das pessoas. Surge então, a moral, a permissividade social de assuntos pertinentes aos bons costumes e subsequentes comportamentos, elasticamente estudados pela Ética. Em síntese, aquilo que for reconhecido como moralmente aceito pertence ao grupo de ações do bem - proporcionam benefícios ao convívio social; moralmente rejeitado, do mal - provocam malefícios, danos morais. Os estudos da Ética abarcarão, indubitavelmente, eventos vinculados a liberdade de expressão, consciência coletiva, juízos de valor coletivo, Leis, ..., transformando a conceituação em aplicação efetiva.

            A Ética no ramo da Psicanálise

            Afinal, qual o significado do termo Ética? O que fundamenta e possibilita a existência da Ética é a moral. Enquanto a moral é constituída pela prática dos costumes do homem, a Ética tem a finalidade de investigar, esclarecer e elaborar conceitos correlatos. Desta forma, ela tenta encontrar um denominador comum sobre as inúmeras práticas morais e formalizar uma característica genérica, uma vez que é impossível atender a cada situação em particular. A Ética, enquanto teoria, procura abarcar o que existe de melhor ou mais apropriado para o convívio social. A moral possui preceitos variáveis em decorrência de oscilações históricas, ou seja, não é permanente e imutável. A ciência da ética estuda justamente as manifestações efetivadas no passado ou no presente e em nenhum momento ela tenta manifestar qualquer juízo de valor a respeito da prática moral.

            Por isso que a moral não é considerada científica mesmo que possam existir determinadas concepções dela que sejam científicas. A fim de explicar determinados comportamentos morais a ética busca relacionar-se com outras ciências como filosofia, psicologia e antropologia. Estas são algumas das ciências que revelam ou justificam algumas atitudes humanas na sociedade e, apesar da Ética ser a teoria do comportamento moral, ela pode influir na prática-moral. A prática-moral está essencialmente correlacionada com a responsabilidade do sujeito da ação. Isto significa que a decisão de efetivar ou não determinada ação é um problema prático-moral, porém o estudo dessa atitude é da competência da Ética. Portanto, o objeto de estudo da Ética é a moral manifesta no comportamento do homem.

            É possível interpretar que a Ética da Profissão deriva da Deontologia[1]. A Deontologia possui a sua etimologia na Grécia – deon ou deontos/logos -, cujo significado seria “o estudo dos deveres”. Ela detém duas perspectivas: a perspectiva teórica; e, perspectiva prática. A comunhão destas dimensões tem por objetivo regulamentar a conduta do ser humano na sociedade. No caso do Psicanalista, o intuito é específico, bem objetivo e muito claro: considerar todos aspectos axiológicos da sociedade para assegurar e preservar o paciente de qualquer forma de exposição. É relevante lembrar que descumprir parte ou todo o regramento instituído resulta em sanções para o transgressor. A Ética Profissional é regida pela razão, ou seja, é uma racionalização que conduz para uma conduta saudável e sustentável, tanto para o paciente quanto para o Analista – ambos evitam a exposição e o desgaste. O Código de Conduta Ética do Psicanalista nada mais é do que um conjunto de regras a serem observadas e que jamais, em hipótese e justificativa alguma, podem ser descumpridas

            Considerações finais 

            Qualquer grupo profissional, necessariamente, se autorregula. Logo, são desenvolvidos conjuntos de regras a partir de estudos éticos e consequentes atos morais instituídos, levando-se sempre em conta os costumes da sociedade. Este regramento garante a plena confiança por parte das pessoas e salvaguarda a reputação da atividade psicanalítica. A conduta ética não preconiza tudo o que o Psicanalista pode fazer, mas sim, aquilo que ele deve fazer, obrigatoriamente fazer. Todavia, este “dever fazer” não pode ser uma obrigação profissional. Este sentimento precisa ser espontâneo, sincero, consciente e verdadeiro. Afinal, como afirmava Kant, os princípios da Ética são Imperativos Categóricos, ou seja, eles mandam, não aconselham. Portanto, o dever está acima do desejo.


[1] CARAPETO, C; FONSECA, F. Ética e Deontologia: manual de formação. Lisboa: Dossier, Comunicação e Imagem, 2012.

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