Por: Ms. Heitor Jorge Lau
Doutorando em Psicologia Cognitiva
Mestre em Educação
Pós-graduado em Gestão de Pessoas
Bacharel em Comunicação Social
Seguindo o
mesmo critério dos textos anteriores, a seguinte redação comportará um recorte
considerado expressivo no contexto geral da Clínica Psicanalítica, uma vez que se
torna impossível redigir comentários – mesmo superficiais - sobre tantos
tópicos importantes e cruciais em reduzido espaço.
A
abordagem que chamou muito a atenção foram três dentre quatro formas de
perceber os afetos da relação
terapêutica por intermédio da perspectiva do terapeuta: “Eu sou o outro”,
“Eu para o outro” e “O outro para mim”. O exercício do “sentir junto”, “ocupar
lugares complementares” e “diferenciar-se destes lugares” – respectivamente -,
exigirá do Psicanalista, simultaneamente, muita empatia e elevada
racionalidade. É intrigante lembrar que através de uma ótica leiga, um
Psicanalista detém a capacidade (ou obrigatoriedade) de portar-se de maneira insensível
e “gélida” perante o seu paciente no transcorrer da sessão. Essa, com certeza,
é uma visão completamente errônea da maioria das pessoas.
Em
contraste a esse ponto de vista equivocado, o compartilhar e sentir promove o
desenvolvimento formativo do analista (e do paciente). É um processo que exige
prudência, todavia, uma trajetória importante e indispensável para a evolução e
capacitação mais aprimorada do profissional que trata da saúde mental. O
cuidado extremo no momento do sentir ancora na razão de não se deixar envolver
emocionalmente pelos problemas do paciente. Não se envolver jamais deve ser
confundido com não ficar atento, não se interessar ou não se comprometer com a
resolução do problema (e até mesmo não sentir). A possibilidade de tal deslize
colocaria todo o processo psicoterapêutico no caminho do fracasso e culminaria,
inevitavelmente, no prejuízo da reputação do analista e da psicanálise.
Das reações somáticas do psicoterapeuta à
interpretação
O
Psicanalista precisa conter as suas reações emocionais (verbais e não verbais) diante
das associações livres do paciente. A capacidade ou intensidade de comedimento
do analista se manifesta de acordo com a sua realidade formativa, do seu
repertório de formas somáticas, dos seus modos de lidar com as situações e
vínculos. A princípio um psicoterapeuta não conseguirá mascarar ou acobertar
plenamente as reações advindas dos Vínculos entre paciente e analista. Mas, o
relevante é saber sentir e expressar
a emoção correta com a intensidade apropriada. Talvez o saber sentir seja a manifestação
mais complicada neste interim. Seria possível dosar a intensidade (com técnica
e treinamento) e escolher no repertório somático pessoal a melhor expressão
diante de uma circunstância.
Porém,
sentir requer experimentação. Por exemplo: o paciente relata a perda do seu
cãozinho de estimação, parceiro fiel, amado, percebido como um filho. Contudo,
o terapeuta nunca desfrutou da companhia de um cão, ou pior, tem aversão a
espécie porque sofre de Rinite Alérgica, por consequência, alérgico aos pelos
do animal. Pergunta: como o analista conseguirá expressar a emoção correta na
intensidade apropriada se ele carece da sensação, emoção, vivência, afinidade,
enfim, desconhece tal sentimento? A dificuldade, nesta exemplificação, está em
buscar um vínculo no sentimento expresso pelo paciente, não no objeto que
ocasionou o sentimento de perda. Logo, é sábio reconhecer que o Processo
Analítico está longe de ser centrado no sujeito do analisando, tampouco do
analista, mas sim nos vínculos estabelecidos entre eles, nos vínculos corretos.
Ao
perceber os vínculos corretos o Psicoterapeuta facilita a Interpretação das
narrativas. A constante interação entre paciente e Psicanalista converte o
terapeuta em participante ativo do processo psicoterapêutico e remove do paciente
o rótulo de narrador passivo, afinal, concomitantemente, eles influenciam um ao
outro através das emoções emanadas. Mas, no final das contas, o sentimento
constitui a emoção ou a partir do sentimento a emoção surge? Algumas vertentes
da ciência sugerem que a emoção é uma disposição de sentimento que abrange
alterações fisiológicas e psíquicas, interferindo de imediato na maneira como o
indivíduo pensa e, consequentemente, se comporta.
É
importante que o Psicanalista tenha conhecimento sobre algumas teorias da
emoção, categorizadas em três princípios: * Princípio Neurológico: postula que as respostas emocionais são provenientes,
unicamente, das atividades cerebrais; * Princípio Fisiológico: presumem que as reações do corpo impulsionam os
reflexos emocionais; * Princípio Cognitivo:
subentendem que os pensamentos e as atividades mentais são as motivadoras das
reações emocionais[1].
Diante desses princípios é prudente considerar que todas as pessoas sentem
emoções, porém, em intensidade, situações e momentos diferentes. Logo, algumas
emoções podem ser admitidas como pertencentes ao senso comum, ou seja, todos
sentem uma determinada emoção nas suas devidas proporções pessoais. Outras, nem
tanto!
No ano
1872, Charles Darwin em sua obra - A Expressão das Emoções no Homem e nos
Animais relata uma experiência: “Encostei meu rosto no vidro grosso, na frente
de uma cobra venenosa, [...] determinado a não saltar para trás se ela me
atacasse, mas assim que ela deu o bote, minha decisão perdeu o efeito, e recuei
de um a dois metros [...]. Minha vontade e razão foram inúteis face à sensação
de um perigo que nunca tinha experimentado”[2].
Nesta
vivência, qual é o princípio ou gatilho que impulsionou a reação? Neurológico,
fisiológico ou cognitivo? A experiência relatada demonstra, incontestavelmente,
que a razão se torna impossibilitada de controlar as reações diante de uma
circunstância introjetada naturalmente nas emoções humanas vinculadas ao medo. É
sabido que cobras podem ser venenosas (a maioria das pessoas não distingui uma víbora
peçonhenta das outras). Portanto, ao serem avistadas, a reação emocional rege
distanciamento ou fuga. Mesmo que um indivíduo nunca tenha sido atacado,
mordido ou se aproximado de uma serpente, a reação de receio e pânico se farão
naturalmente presentes. Assim, torna-se evidente que as influencias emocionais
podem ser natas ou decorrentes de uma experiência. E, nada mais sensato, que
presumir que as emoções preparam para o inevitável e protegem o ser humano. As
emoções são as representações básicas dos meios inteligentes não conscientes,
desencadeados por processos primários cujas expressões de palavras ausentes
invocam respostas igualmente sem palavras, ou seja, a interpretação.
Considerações
finais
O ambiente terapêutico e a interpretação das emoções
O ambiente
onde acontece a sessão merece atenção especial. Ele precisa ser configurado sem
preferências e desejos pessoais – foco: o paciente. As cores, o mobiliário, a
disposição dos objetos, enfim, tudo requer planejamento meticuloso. Contudo, um
detalhe que merece reflexão diz
respeito ao posicionamento do divã. Esta redação elencou a percepção dos afetos
e dedicou contemplação sobre o sentimento e a emoção. Excluindo as etapas da
anamnese e entrevista, um paciente em terapia permaneceria postado no divã à
frente da posição do terapeuta (a prática sugere). Nesta perspectiva o
Psicanalista fica impossibilitado de perceber as reações fisionômicas do
paciente. A comunicação não verbal seria indispensável para uma contextualização
mais ampla e precisa da narrativa durante as associações livres. Portanto, a
decisão de onde ou como dispor o paciente e analista não podem ser
negligenciadas. A certeza é de que as formas somáticas, o processo formativo, o
envolvimento do paciente com as regras da livre associação, tudo gravita em
torno de emoções e sentimentos.
[1]
PAUL, K. Tudo que você precisa saber
sobre psicologia: um livro prático sobre o estudo da mente humana.
Tradução: Leonardo Abramowics. São Paulo: Gente, 2015.
[2]
PAUL, E. A linguagem das emoções:
revolucione sua comunicação e seus relacionamentos reconhecendo todas as
expressões das pessoas ao redor. Tradução: Carlos Czlak. São Paulo: Lua de
Papel, 2011.
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