quinta-feira, 20 de junho de 2024

COMPORTAMENTO HUMANO: O MASCARAMENTO DA REALIDADE QUE NÃO SE DESEJA VER

 

O PLÁSTICO NOSSO DE CADA DIA: UMA CRISE GLOBAL AMEAÇADORA

    Nos últimos anos, o mundo acompanha um aumento alarmante no uso e descarte de plásticos. Essa proliferação desenfreada trouxe consigo uma série de repercussões negativas, tanto para o meio ambiente quanto para as pessoas. O plástico, com sua durabilidade e versatilidade, transformou-se em uma solução e, ao mesmo tempo, em uma maldição para a humanidade. Um dos principais problemas associados ao uso excessivo de plástico é a poluição. Toneladas e mais toneladas de plástico são lamentavelmente descartadas nos oceanos, rios e em áreas terrestres diariamente, resultando na degradação dos ecossistemas aquáticos e terrestres. Animais marinhos como tartarugas, aves e peixes, muitas vezes confundem os resíduos plásticos com comida, o que pode provocar a morte por ingestão ou simplesmente por ficarem presos no acúmulo dessas sobras. Estudos recentes têm demonstrado a presença de microplásticos em diversos alimentos e até mesmo na água potável que sai todos os dias das torneiras da nossa casa, o que levanta preocupações sobre os potenciais impactos à saúde humana a longo prazo.

    Além da poluição, a produção e o descarte de plástico também contribuem significativamente para as emissões de gases de efeito estufa e para a crise climática e catástrofes como a presenciada recentemente. Desde a extração de matérias-primas até a fabricação e o transporte de produtos plásticos, o processo consome abundantes de energia e recursos naturais, emitindo gases nocivos para a atmosfera. Além disso, a incineração de plásticos libera poluentes tóxicos no ar, contribuindo ainda mais para a degradação da qualidade do ar e para os impactos negativos na saúde humana. O plástico não é biodegradável. Ele leva de 400 até 450 anos para se decompor completamente. Portanto, façamos um cálculo: aquele primeiro plástico jogado no mato em 1907 ainda continua lá. Simples assim! No ano de 1907 o inventor Leo Baekeland - conhecido como o pai do plástico - inventou o primeiro plástico totalmente sintético, conhecido como baquelite. Este novo material era durável, resistente ao calor e eletricamente isolante, tornando-o ideal para uma variedade de aplicações industriais, desde telefones até peças de automóveis. A partir daí, o desenvolvimento de novos tipos de plásticos acelerou rapidamente, impulsionado por avanços na química e na tecnologia de materiais.

    O plástico, em sua forma moderna, é relativamente jovem quando comparado a outros materiais. Sua história remonta ao século XIX, quando cientistas começaram a explorar maneiras de criar materiais sintéticos que imitassem as propriedades de materiais naturais, como a borracha e o marfim. No entanto, foi apenas no início do século XX que o plástico começou a ser produzido em larga escala e utilizado em uma ampla variedade de aplicações. Na medida que o uso do plástico aumentava, surgiram preocupações crescentes sobre os impactos ambientais associados à sua produção e descarte. Todavia, uma das maiores falácias disseminadas sobre o plástico foi a crença de que ele era facilmente reciclável e que, portanto, seu descarte não representava um problema. Na verdade, apenas uma minúscula fração dos plásticos produzidos mundialmente é reciclada efetivamente, com grande parte descartado em aterros sanitários, a maioria clandestinos. O plástico é um material extremamente difícil de reciclar. Diferentes tipos de plásticos são compostos por propriedades químicas distintas, o que torna o processo de reciclagem complexo e custoso.

    Além disso, muitos produtos plásticos são projetados para serem descartáveis e de uso único, o que significa que mesmo os itens que poderiam ser reciclados muitas vezes não o são devido à falta de infraestrutura e incentivos para a reciclagem. Como resultado, bilhões de toneladas de plástico acabam poluindo o meio ambiente a cada ano, causando danos irreparáveis aos ecossistemas terrestres e aquáticos. Os oceanos, em particular, tornaram-se um depósito gigante de plásticos, com áreas como o Grande Depósito de Lixo do Pacífico, conhecido como "Grande Patches de Lixo". Esse local nefasto configura-se com o acúmulo de resíduos plásticos de 1,6 milhão de quilômetros quadrados e cerca de 80 mil toneladas de resíduos, irresponsavelmente jogados no mar. Sua localização se encontra entre a Califórnia e o Havaí e o seu tamanho representa cerca de três vezes a extensão territorial da França. Mas...quem se importa? Poucos. Grandes empresas em todo o mundo têm se envolvido em campanhas de conscientização sobre a reciclagem, as quais promovem a reciclagem de plástico como uma solução para a crise global do plástico.

    No entanto, por trás dessas “lindas” declarações, esconde-se uma triste verdade: a reciclagem de plástico, como é praticada atualmente, é na maioria uma farsa. Documentários sobre a temática relatam que muitas empresas fazem alarde (marketing) sobre seus programas de reciclagem de plástico, retratando-se como defensoras do meio ambiente e da sustentabilidade. No entanto, a realidade exposta é que essas empresas têm pouco interesse em resolver realmente o problema do plástico. Em vez disso, o mote da reciclagem serve apenas como oportunidade de melhorar a imagem institucional e evitar regulamentações mais rigorosas sobre o uso de plástico virgem. Uma das principais táticas utilizadas por algumas empresas é o chamado "greenwashing" - lavagem verde -, que envolve a promoção enganosa de práticas ou produtos como sendo ecologicamente corretos, quando, na verdade, não são. Ao investir em campanhas publicitárias que destacam seus esforços de reciclagem, essas empresas tentam desviar a atenção de suas práticas de produção insustentáveis e do papel central que desempenham na perpetuação da crise do plástico.

    Além disso, mesmo quando as empresas se comprometem em aumentar a sua taxa de reciclagem de plástico, muitas vezes isso é apenas parte da história. Inúmeros desses programas de reciclagem são ineficazes e mal administrados, resultando em uma quantidade mínima de plástico sendo realmente reciclada. Em alguns casos, o plástico coletado para reciclagem é simplesmente enviado para países subdesenvolvidos (ou... nem tanto), onde é frequentemente descartado de forma inadequada ou incinerado. Outro aspecto preocupante é o conceito de "reciclabilidade", promovido por algumas empresas como uma solução para o problema do plástico. A ideia é que, se um produto plástico for rotulado como "reciclável", os consumidores se sentirão menos culpados ao descartá-lo, acreditando que ele será devidamente reciclado e transformado em novos produtos. No entanto, a realidade é que a maioria dos plásticos rotulados como "recicláveis" ainda enfrenta enormes desafios em termos de infraestrutura de reciclagem e demanda de mercado, o que significa que grande parte desse plástico ainda acaba sendo descartado de forma irresponsável. Enfim, é urgente que o consumidor esteja ciente da verdade por trás da reciclagem de plástico. Diante dessa crise global do plástico, é fundamental repensar a nossa relação com esse material e adotar medidas concretas para reduzir o seu consumo e promover práticas de descarte mais responsáveis.

A VIDA COMO ELA É

 

A FARSA DA MERITOCRACIA

    Nos tempos modernos, o termo "meritocracia" tem sido amplamente glorificado como o sistema ideal para determinar o sucesso e a posição social de indivíduos. A ideia parece simples e justa à primeira vista: as pessoas avançam com base no mérito, nas suas habilidades e no seu esforço pessoal. No entanto, essa narrativa esconde uma série de falácias e injustiças profundas que perpetuam desigualdades e exclusões. Em sua essência, a meritocracia sugere que qualquer um pode alcançar sucesso se trabalhar o suficiente. No entanto, essa crença ignora contextos sociais, econômicos e históricos que moldam significativamente as oportunidades de cada indivíduo.

     A verdade é que nem todos começam a corrida da vida no mesmo ponto de partida. Fatores como classe social, etnia, gênero, orientação sexual e acessibilidade têm um peso avassalador na determinação do sucesso de alguém, muitas vezes mais do que o próprio mérito. A noção de mérito muitas vezes desconsidera como sistemas históricos de opressão moldaram o presente. Por séculos, grupos minoritários foram sistematicamente excluídos de oportunidades educacionais, econômicas e políticas significativas. Mesmo hoje, vestígios dessas injustiças persistem, afetando profundamente as chances de sucesso de indivíduos de certos grupos. A meritocracia também tende a privatizar o mérito enquanto socializa o fracasso. Portanto, o sucesso é visto como resultado exclusivo do esforço individual, enquanto o fracasso é frequentemente atribuído a falhas pessoais. Isso ignora as estruturas sistêmicas que limitam oportunidades e perpetuam desigualdades, como acesso desigual à educação de qualidade, redes de apoio social e oportunidades de emprego. 

     A promessa de igualdade de oportunidades na meritocracia muitas vezes mascara desigualdades reais. Aqueles que começam com vantagens significativas - seja por meio de herança financeira, capital social ou privilégio estrutural - têm uma vantagem desproporcional na competição por recursos e reconhecimento. Isso cria um ciclo de perpetuação de privilégios e marginalização para aqueles que estão em desvantagem. A obsessão pela meritocracia também contribui para uma cultura de hipercompetitividade, onde o valor de um indivíduo é frequentemente medido pelo seu sucesso material e posicionamento social. Isso não apenas aumenta os níveis de estresse e ansiedade na sociedade, mas também desvaloriza formas de contribuição humana que não se enquadram em medidas quantitativas de sucesso. 

     Em vez de glorificar a meritocracia como a solução para todas as desigualdades, devemos considerar abordagens mais holísticas e inclusivas para avaliar o valor e o potencial das pessoas. Isso pode incluir políticas públicas que visam reduzir disparidades de acesso, programas educacionais que valorizam a diversidade de habilidades e perspectivas, e uma redistribuição mais equitativa de recursos para garantir que todos tenham condições justas de desenvolver seus talentos. Em suma, a meritocracia é um mito perigoso que perpetua desigualdades ao mascarar privilégios históricos e estruturais. Ao invés de exaltar o mérito individual como o único critério de sucesso, precisamos reconhecer e abordar as desigualdades estruturais que moldam as oportunidades de cada pessoa desde o nascimento. Somente então poderemos avançar em direção a uma sociedade mais justa e inclusiva, onde o potencial de cada indivíduo seja verdadeiramente valorizado e nutrido, independentemente de sua posição inicial na corrida da vida.

segunda-feira, 10 de junho de 2024

A Natureza e o Comportamento Humano: qual a associação?

 

PONTO DE EBULIÇÃO

 Em meio ao vasto cosmos, um pequeno ponto azul (ainda) brilha intensamente. É a Terra, o nosso precioso e inconfundível lar, um planeta em constante ebulição, tanto literal quanto metaforicamente. A ebulição literal se manifesta nos elementos que compõem o planeta. Vulcões vociferam em fúria, expelindo lava incandescente e gases tóxicos. Oceanos agitados fervilham com correntes violentas, por vezes traduzidos em tsunamis, enquanto tempestades elétricas varrem os céus e por vezes a terra. O clima oscila incompreensível e surpreendentemente, os extremos se tornam mais frequentes e devastadores, desencadeando furacões, secas e inundações catastróficas como as recentemente vivenciadas - sinais evidentes e inegáveis dessa ebulição planetária, resultado direto da interferência humana.

 Por outro lado, a ebulição metafórica reflete as tensões e os conflitos que permeiam a sociedade humana - e não são poucos. Desigualdades sociais fervilham, causando rupturas e conflitos em diversas partes do mundo. As guerras, o terrorismo e a opressão corroem os alicerces fundamentais da paz e da estabilidade mundial. A ganância e o egoísmo desenfreados alimentam a destruição do meio ambiente e o esgotamento dos recursos naturais, empurrando o planeta para um ponto sinistro e lamentável de não retorno.

 É preciso observar com um certo grau de urgência a gravidade da situação que enfrentamos atualmente. As mudanças climáticas estão entre os desafios mais prementes e complexos de nosso tempo, com implicações profundas para o meio ambiente, a sociedade e economia global. A natureza não escolhe partido, raça, cor, enfim, não possui empatia ou preferência de qualquer espécie. Ela reage e não mede consequências, não pede licença ou olha para trás.  Os dados científicos são claros e inegáveis: as atividades humanas, especialmente a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento desenfreado, têm impulsionado um aumento significativo nas concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera. Como resultado, estamos testemunhando um aquecimento global acelerado, com consequências devastadoras (e até mesmo parcialmente previsíveis) em todos os cantos do planeta.

 Uma das manifestações mais visíveis das mudanças climáticas é o aumento das temperaturas médias globais. Dados científicos demonstram que, por oito meses seguidos, o planeta contabilizou os períodos mais quentes desde o início dos registros em comparação com o mês correspondente dos anos anteriores. O ano de 2023 foi considerado o mais quente em 174 anos de medições meteorológicas, superando os anos de 2016, com 1,29 °C acima da média, e 2020, com 1,27 °C acima da média. No período entre fevereiro de 2023 e janeiro de 2024, a temperatura média ficou 1,52 °C acima da registrada na era pré-industrial. Parece pouco, mas não é!

 Não é à toa que a humanidade está presenciando uma sucessão de eventos catastróficos com intervalos mais curtos. O aquecimento global desencadeia uma série de impactos, incluindo o derretimento das calotas polares e das geleiras, a elevação do nível do mar, eventos climáticos extremos mais frequentes e intensos e mudanças nos padrões de precipitação. Aliás, este último comprovou nos últimos tempos que os modelos de previsão de precipitação não atingem mais um grau de assertividade idealmente seguro.

 Além disso, as mudanças climáticas estão provocando perturbações significativas nos ecossistemas terrestres e marinhos. Espécies estão migrando para altitudes mais elevadas (inclusive a espécie humana) e latitudes mais ao norte em busca de condições climáticas adequadas, enquanto outras enfrentam a ameaça de extinção devido à perda de habitat e às alterações em seus ciclos de vida. Os recifes de coral estão sofrendo branqueamento em massa devido ao aumento da temperatura da água, e os sistemas de recifes estão arriscando colapsar.

 Por fim, as mudanças climáticas também têm sérias implicações socioeconômicas. Comunidades vulneráveis, incluindo aquelas em regiões ribeirinhas, costeiras, áreas áridas e ilhas pequenas, são especialmente afetadas pelos impactos das mudanças climáticas, enfrentando ameaças à segurança alimentar, infraestrutura, saúde pública e estabilidade econômica.

 Diante desse cenário alarmante, é imperativo que tomemos medidas urgentes e decisivas para mitigar as mudanças climáticas e adaptar-nos aos seus impactos inevitáveis. Muitos estão acenando para ações de como lidar com os resultados das catástrofes quando o certo seria acenar (também) para as ações de como tentar evitar que elas aconteçam. Tem gente que até pensa em colonizar Marte ao invés de salvar o planeta em que vive. Fala sério! Isso requer uma ação coordenada ao nível global, com políticas ambiciosas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, promover a transição para fontes de energia limpa e sustentável, proteger ecossistemas vitais e fortalecer a resiliência das comunidades mais vulneráveis.

 O futuro do planeta e de suas muitas formas de vida está em jogo, e é nossa responsabilidade e obrigação agir com determinação e urgência para garantir um futuro sustentável para as gerações futuras. Apesar das adversidades, há esperança! Assim como a ebulição pode purificar, transformando impurezas em vapor, a crise que enfrentamos pode ser um catalisador para a mudança. A consciência ambiental cresce, determinados movimentos sociais sérios e sensatos lutam por justiça e igualdade, e avanços tecnológicos oferecem soluções inovadoras para os desafios globais.

 Nós, habitantes deste planeta em ebulição, temos o poder (e dever) de influenciar e talvez minimizar o curso dos acontecimentos. Cabe a nós escolhermos entre a inércia e a ação, entre a destruição e a regeneração. O futuro da Terra está em nossas mãos. Que possamos agir com sabedoria e compaixão, trabalhando juntos para transformar a ebulição caótica em um novo equilíbrio, onde a harmonia entre a natureza e a humanidade seja restaurada, sem demora.

 

                                                                                                        Heitor Jorge Lau

                                                                                                            Relações Públicas