“Louco
não é o homem que perdeu a razão.
Louco
é o homem que perdeu tudo menos a razão.”
Aforismo
dito por G. Chesterton, escritor britânico falecido em 1936.
O
louco age como uma máquina cuja racionalidade é privada de emoções e de afetos...
beira a psicopatia. No século passado os cientistas cognitivos tentaram separar
a razão da emoção. Não se tratava, entretanto, de pura e simplesmente negar a
existência das emoções. Separar a razão das emoções era um preceito
metodológico, a ideia de estudar a cognição humana por partes. Primeiro modelar
o raciocínio, depois, acrescentar as emoções. Essa era a ideia do modelo
computacional da mente. Na filosofia, uma teoria computacional da
mente denomina uma visão de que a mente humana ou o cérebro humano (ou
ambos) é um sistema de processamento de informações e que o pensamento é uma
forma de computação. Tal teoria foi proposta (em sua forma moderna) por Hilary
Putnam (1961) e pelo cientista cognitivo Jerry Fodor. Todavia, seria esse o
caminho adequado? Essa trajetória foi interrompida em 1994, com a publicação do
livro O Erro de Descartes, redigido por Antonio Damásio (neurobiólogo),
que, rapidamente, ultrapassou os muros da academia para se tornar um best-seller
internacional.
No
livro, a argumentação era que a razão não poderia ser separada das emoções. A sua
objeção era contundente. Não se tratava apenas de objetar a receita
metodológica dos cientistas cognitivos. Damásio mostrou que a razão e a emoção
estão indissoluvelmente associadas e que na verdade não há raciocínio numa
forma pura, independente, a não ser que se cometa o erro de Descartes, ou seja,
separar mente e corpo como se fossem substâncias distintas. Em outras palavras,
a razão só é racional se ela for permeada pelas emoções. Nas últimas décadas, a
ciência cognitiva, impulsionada pelo florescimento da neurociência,
praticamente abandonou o modelo computacional da mente. Ele é um bom modelo
para construir inteligências artificiais, mas não para explicar o modo como os
seres humanos pensam e agem.
Ninguém
pode existir desmunido de emoções. Essa constatação fundamental abre para a
neurociência e para a ciência cognitiva uma via nova, na medida que leva em
conta o papel fundamental das emoções na vida cerebral. A razão e a cognição
não podem se desenvolver e exercer suas funções normalmente se não forem
sustentadas pelos afetos. Para pensar, conhecer, é preciso que as coisas tenham
um peso e um valor. A indiferença emocional anula o relevo, apaga a diferença
das perspectivas... nivela tudo. Privado de seu poder crítico, sua capacidade
de discriminar, diferenciar, que se origina da emoção, o raciocínio se torna
raciocínio a sangue frio, não raciocina mais. Consciência e emoção não são
separáveis. As funções cognitivas de alto nível como a linguagem, memória,
razão e atenção estão ligadas aos processos emocionais, especialmente quando se
trata de questões pessoais e sociais que envolvem risco. Estudos recentes com
crianças abandonadas mostram que a privação de afeto causa graves atrasos
psicomotores.
A
busca pela compreensão de si mesmo é um dos propósitos mais antigos da
humanidade. Seja no âmbito do senso comum, filosófico ou científico, o ser
humano procura explicitar as suas características, semelhanças e diferenças com
os demais entes e as suas relações com o meio em que vive. Em grande parte
destas investigações entende-se que os seres são constituídos de cognição,
emoções e ações em constante interação. Embora possuam semelhanças,
as perspectivas apresentam inconsistências, divergindo, por exemplo, na
natureza das interconexões ou nos portadores destes elementos. Neste último
caso, muitas abordagens consideram unicamente os humanos como detentores da cognição
e emoção, assegurando-lhes a exclusividade da ação moralmente avaliável. Em
outras abordagens, animais não humanos ou sistemas como robôs poderiam, de um
modo ou de outro, possuir cognição, emoções e, assim, de alguma forma, ser
considerados agentes morais. Enfim, não é preciso ser PhD em Neurociência para
se chegar a conclusão que a razão e emoção se completam.
Nenhum comentário:
Postar um comentário